Teste de FOCO

Entre falhas e desafios, um imprevisto logístico transformou a trajetória olímpica em um teste de força e superação

O caminho até as Olimpíadas raramente é linear, e para alguns atletas é marcado por altos e baixos, temores e ansiedades. Muitas vezes, situações inesperadas fogem do controle do atleta, como falhas na organização do evento. Lívia Avancini, de 32 anos, atleta do arremesso de peso da Fundação de Esportes de Londrina (FEL), da Prefeitura Municipal de Londrina, enfrentou uma dessas dificuldades em sua jornada para Paris 2024. Inicialmente classificada para os Jogos com a 33ª posição no ranking mundial, ela foi desclassificada devido à falta de testes antidoping surpresa exigidos antes das Olimpíadas. Quando soube que estava fora da lista de convocados, seu sonho parecia ter sido interrompido.

A reviravolta aconteceu quando a Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt) recorreu à Corte Arbitral do Esporte (CAS), que garantiu sua reintegração à competição. Com a decisão favorável, Lívia pôde focar nos treinos e seguir para Paris, onde terminou na 29ª posição nas eliminatórias.

A desclassificação ocorreu pela ausência de um teste antidoping nos meses anteriores aos Jogos. A atleta, que foi prata no Troféu Brasil deste ano e estava na 33ª posição do ranking mundial, passou dias de desespero até receber a confirmação positiva do recurso no CAS, que também beneficiou outros dois brasileiros.

Embora os resultados não tenham sido os esperados e a incerteza tenha afetado seu desempenho, Lívia considera sua participação nos Jogos Olímpicos um marco em sua carreira. “A energia das Olimpíadas é diferente”, afirma ela, com 20 anos de trajetória no atletismo. Entrar no estádio, com os torcedores gritando “Brasil”, foi uma emoção indescritível. “Eu só chorava e ficava toda emocionada”, conta Lívia, que, antes, durante e depois das provas, passou por um verdadeiro teste de resiliência e força mental.

Em que momento você percebeu que algo estava errado em relação aos testes antidoping antes das Olimpíadas?

Foi uma questão bem peculiar. Eu e mais dois atletas passamos por essa situação. A gente conseguiu se classificar, mas foi de uma forma que gerou muita ansiedade e sofrimento. Não precisava ter sido assim. Isso acabou marcando minha primeira Olimpíada de uma forma muito negativa.

Você precisava de seis testes e realizou cinco. De quem foi o erro?

Foi um erro logístico da organização do evento. Acho que foi falta de atenção em confirmar quem estava na lista para fazer esses exames. Eles tiveram oportunidades [para fazer os testes], mas era muita gente para ser monitorada. Eu moro em Londrina, no interior do Paraná, então a logística envolvia deslocamentos. Não foi de propósito, foi um problema de organização, mas eles poderiam ter feito os testes em mim em outro momento.

O que acha que teria acontecido se você não tivesse conseguido ir às Olimpíadas?

Eu provavelmente teria processado a galera. Já tínhamos uma equipe montada para entrar com um processo por danos morais. Eu não sei se estaria treinando ainda. Seria um golpe muito forte na minha vida como atleta. Isso iria me abalar muito, e eu talvez demorasse a me restabelecer. Além disso, ir para as Olimpíadas melhora muito a vida de um atleta, abre oportunidades que eu poderia perder.

Quais oportunidades? 

Mudaria os valores do bolsa atleta, melhoraria o salário da equipe. Pode acontecer alguns patrocínios individuais que também seria muito interessante. A gente pode tentar aprovação de projetos no âmbito federal e estadual, pra arrecadar recursos pro ano que vem, pra já bolar todo o projeto de viagens do ano que vem. Competições, essas coisas que a gente sabe o quanto é difícil bancar isso do bolso, né? Então mudaria muita coisa. 

Você sentiu que toda essa situação trouxe algum prejuízo na hora da competição?

Durante os dias em que eu fiquei esperando, foi bem complicado. Eu realmente fiquei desconectada. Cabeça, corpo, treino, não estava rolando. Sei que nessas três semanas em que eu fiquei [desconectada], eu perdi um pouco daquela coisa, sabe? Que a gente estava ali, treinando, focada no negócio. E aí, de repente, você perde. Não adianta. Você acaba se desestabilizando. Sei que o meu desempenho na prova não foi o dos melhores e isso foi um reflexo dessas três semanas que eu fiquei debilitada. Porque não foi só físico, foi mental, foi psicológico. Eu parei de comer, não conseguia dormir e tive que tomar remédio para conseguir me restabelecer. E isso você não consegue esquecer do dia pra noite. Mas depois que tive a positiva [da vaga], eu fiquei feliz. Eu treinei todos os dias, mas vi que eu estava pagando um preço por ter vivido as três semanas de dificuldade. Foi uma falta de respeito com o atleta. Todo mundo fala que são quatro anos de trabalho, mas não. São todos os anos que antecederam, desde que começamos a treinar, ou até antes. 

Depois de tudo isso, houve algum aprendizado ou amadurecimento?

Talvez no âmbito espiritual, porque tivemos que nos apegar a alguma coisa, ter fé. Foi fácil pensar em surtar, mas conseguimos nos manter firmes. O maior crescimento foi ter participado das Olimpíadas, apesar de tudo.

Você já pensa na próxima?  Sim, estou pensando na próxima, porque já não estou tão nova. A gente acaba tendo que se esforçar bastante em treinamento. Aí eu fico pensando: meu Deus, estou ficando velha. Parece que o treino que eu fazia alguns anos atrás, hoje em dia, está sendo uma pancada, sabe? A gente está lidando com as dificuldades. Esses treinos de base agora de final de ano são bem pesados. Um passinho de cada vez, claro. Mas a gente vai pensar no que a gente pode fazer pra tentar chegar lá da melhor forma.

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